Frustração millennial + maternidade: quando a crise de propósito encontra a sobrecarga
"Eu fiz tudo certo e ainda assim me sinto perdida."
Essa foi a frase de uma paciente que poderia ter sido dita por milhares de mulheres dessa geração. Aos 40 anos, depois de uma vida dedicada aos estudos, à carreira e às escolhas “certas”, ela se viu mergulhada em uma crise de propósito, exausta e sem conseguir reconhecer a mulher que era antes.
Essa é a frustração millennial, a nova crise de meia-idade dessa geração — marcada por um mercado de trabalho instável, custo de vida alto, hiperconexão e a sensação de nunca ser suficiente. E para muitas mulheres, a maternidade chegou junto — ou logo antes — dessa crise, tornando tudo ainda mais intenso.
Chegar aos 40 anos era, para muitos de nós, sinônimo de ter “chegado lá”. Uma carreira estável, independência financeira, casa própria, férias planejadas, um certo equilíbrio entre vida pessoal e profissional. A geração millennial — nascida entre 1984 e 1995 — acreditou nessa promessa. E, em grande parte, fez tudo certo para alcançá-la: estudou, se dedicou, trabalhou duro e obedeceu às regras do jogo.
Mas a realidade se impôs: um mercado de trabalho instável, custo de vida cada vez mais alto, crises econômicas, a hiperconexão e a cultura da performance trouxeram um peso inesperado. E agora, às vésperas (ou já dentro) dos 40, muitas pessoas — especialmente mulheres — sentem que não chegaram lá. Pelo contrário: sentem que estão longe de onde gostariam.
A nova crise de meia-idade dos millennials é uma combinação de frustração e perda de engajamento marcada por pressões únicas:
- cuidar dos filhos;
- ajudar pais envelhecendo;
- se reinventar profissionalmente;
- lidar com a exaustão mental de estar sempre “em falta”.
E para muitas mulheres, a maternidade chegou junto — ou logo antes — dessa crise, potencializando os desafios.
Quando a maternidade agrava a crise
Ter filhos em uma fase mais tardia da vida, como ocorre com boa parte das mulheres millennials, acrescenta novas camadas de complexidade e pressão:
- O luto pela identidade anterior: sentir que já não se reconhece mais fora do papel de mãe.
- A sobrecarga de papéis: mãe, profissional, filha, parceira — todos ao mesmo tempo.
- A busca pela perfeição materna, que alimenta a culpa e a sensação de insuficiência.
- O impacto na carreira, que pode ser interrompida, desacelerada ou tornar-se mais insegura justamente quando a estabilidade parece mais necessária.
- O cansaço físico e emocional, agravado por noites mal dormidas, demandas constantes e falta de tempo para si.
O impacto na saúde mental
Tudo isso tem consequências concretas para a saúde mental dessa geração de mães:
- Ansiedade crônica;
- Burnout materno e profissional;
- Depressão;
- Sensação de estagnação e vazio;
- Dificuldade para descansar sem culpa.
Essa sensação de “ter feito tudo certo e ainda assim não ter chegado lá” mina a autoestima e o senso de propósito. E como um ciclo, a saúde mental abalada fragiliza também a relação com os filhos.
Como isso afeta a relação com os filhos?
Os primeiros anos de vida — a primeira infância — são a base para o desenvolvimento emocional, cognitivo e social de uma criança. Mães exaustas e sobrecarregadas têm mais dificuldade de estar emocionalmente disponíveis, de brincar com leveza, de responder com paciência e sensibilidade às necessidades dos filhos.
Isso não significa que essas mães não amem profundamente ou que sejam “inadequadas”. Significa que elas estão pagando um preço alto por carregar tudo sozinhas — e que cuidar de si não é só um direito, mas também uma necessidade para sustentar a relação com seus filhos.
Um convite ao cuidado
Não é você que falhou. É um mundo que exige demais, entrega pouco apoio e vende uma ilusão de que podemos dar conta de tudo sem nos despedaçar no caminho.
Reconhecer a dor, dar nome ao que se sente e buscar ajuda — seja através de terapia, de uma rede de apoio, de limites mais claros ou de escolhas mais realistas — é o primeiro passo para reencontrar a si mesma.
Cuidar da sua saúde mental é também um gesto de amor pelos seus filhos. Porque uma mãe que se sente mais inteira pode oferecer um colo mais seguro.
Se você se reconheceu nesse texto: respire. Você não está sozinha.
É possível construir um caminho mais leve, possível e verdadeiro para você — e para a relação com seus filhos e família. Você pode começar agora e pode contar comigo para te conduzir nesse processo.
Eu adoraria saber o que essa reflexão desperta em você. Compartilha aqui comigo nos comentários ou por mensagem.
Katherine Sorroche, mãe da Alice e do Gabriel
Psicóloga | Especialista em saúde mental materna, puerpério e identidade feminina
Ajudo mulheres a se reencontrarem como mulheres, mães e profissionais — sem se anularem no processo.